A novela faz parte da vida do brasileiro desde o rádio, ocupou
e ocupa um enorme espaço na rotina de milhões de vidas país a fora e houve um
tempo em que ela era somente entretenimento.
Universos distantes da realidade e sem nenhuma conexão com
nossas problemáticas, encantavam os que não perdiam um capítulo. Mocinhas sonhadoras,
príncipes de capa e espada, vilões terríveis e tramas mirabolantes, serviam
para distrair e retirar da dura rotina o cidadão médio que não tinha, fora dalí,outra
forma de sonhar.
Acusada, com razão, de alienar e impedir a percepção da realidade,
durante anos a novela foi renegada ao plano de subcultura e alvo das críticas
de intelectuais inconformados com a absoluta falta de senso crítico dos
telespectadores.
Lembro-me da minha infância povoada de novelas que me eram
proibidas e, por isso, mais desejadas, das noites que passava com a televisão
ligada sem som, em pé na cama com a coberta por cima de mim e da TV para que
não se visse a luz, na tentativa de não perder o capítulo de Irmãos Coragem ou
Selva de Pedra e dos inúmeros castigos quando pega no ”delito”.
Os tempos mudaram e,claro,a novela também. Hoje, novela é janela,
é palco de debates de situações que estão no dia a dia, levanta questionamentos
que povoam a realidade e, de quebra, traz, mesmo que de forma superficial, elementos
de culturas diferentes que de outra maneira não seria conhecida pela maioria
dos brasileiros.
A novela não perdeu seu caráter de obra ficcional e,
portanto, recheada de personagens caricatos, visões maniqueístas, ilusões românticas,
mas vai longe à época em que sua função era só a da fantasia, ou inconsequente,
ou a serviço da alienação orquestrada. O mundo não comporta mais a ingênua manipulação
e o alcance das informações não mais é restrito a um único veículo.
Se ainda existem pessoas que se deixam enredar pela rasa e
literal visão dos fatos?Claro, mas não é a novela, nem a responsável, nem a
maior incentivadora deste comportamento.
Quem, por opção ou por falta dela, enxerga o mundo em apenas
duas dimensões, se manterá apartado da prática da cidadania, alheio a
intervenção nas relações sociais, políticas e econômicas com ou sem audiência as
novelas, ou nunca vimos alguém interpretando, por exemplo, a bíblia de forma
literal?Fato alias, que mesmo sem concordar deve-se respeitar.
Depois, combinemos, guardadas as devidas proporções, até os
grandes clássicos da literatura mundial, podem servir para arrastar da
realidade quem, fora dela, encontra seu lugar.
Gosto, não se discute, mas quem ainda vocifera contra as novelas,
por pura hipocrisia intelectualóide, mesmo que imbuído de belas intenções, deveria,
num exercício de humildade, despir-se dos pré-conceitos, não para,
necessariamente, se transformar em seguidor assíduo dos folhetins televisivos, mas
para entender em todas as suas sutis nuances, o que se vê por esta janela.
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